Na audiência pública que tratou do tema “O fortalecimento da DESO como empresa pública”, realizada na manhã desta sexta-feira, 2, na Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe (Alese), duas questões ficaram bastante evidenciadas: a companhia sergipana de saneamento é viável economicamente e plenamente capaz de responder aos desafios de atingir a universalização dos serviços de fornecimento de água e tratamento de esgoto até 2033, como determina o novo marco legal do saneamento básico, a Lei nº 14.026/2020.
A iniciativa do debate foi do deputado estadual Iran Barbosa (Psol), a partir de uma solicitação feita por dirigentes do sindicato dos trabalhadores dos setores hídrico e de saneamento básico do estado, o SINDISAN.
Discutiram o tema da Audiência o presidente do sindicato, Silvio Sá; o assessor de Saneamento da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e secretário Executivo do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS), Edson Aparecido da Silva; o engenheiro civil e assessor de Planejamento e Gestão Empresarial da DESO, Rodrigo Fernando; e o ex-supervisor técnico do Escritório Regional do DIEESE em Sergipe, Luiz Moura.
Na avaliação do deputado Iran Barbosa, a audiência pública foi fundamental para acessar dados importantes que ajudam a entender o papel da DESO enquanto empresa pública e a sua viabilidade técnica e econômica para continuar prestando seus serviços à população como estatal, não sendo necessária a sua privatização.
“Tivemos aqui acesso a dados importantes que mostram que a nossa Companhia de Saneamento é viável e lucrativa, ainda que o lucro não seja o mais importante para uma empresa pública. A DESO não dá prejuízo, e pode reinvestir o resultado financeiro positivo dos serviços que presta, de forma que fica evidente a inadequação de qualquer forma de privatização dessa empresa. Portanto, seguiremos firmes defendendo o seu caráter público e a sua importância para o desenvolvimento dos sergipanos”, afirmou o parlamentar.
Lutas do sindicato
Em sua exposição, o presidente do SINDISAN, Silvio Sá, agradeceu à categoria pela presença maciça, lotando as galerias e o plenário da Alese, e apresentou um panorama histórico das lutas do sindicato, em sua gestão, contra a privatização da DESO, além de destacar momentos importantes que fortaleceram a Companhia como pública, como a revogação do estudo de modelagem do BNDES, no governo de Jackson Barreto, e a assinatura histórica do contrato de programa entre a DESO e a prefeitura municipal de Aracaju.
“Busquei mostrar a luta política que travamos, durante os cinco anos do meu mandato, trazendo a realidade que enfrentamos e o debate público que fizemos, especialmente nas câmaras municipais e também na Alese, e das articulações que realizamos com vereadores e parlamentares estaduais e federais, na defesa da nossa empresa de saneamento como pública. E também destaquei propostas técnicas para melhorar o abastecimento em algumas cidades sergipanas que hoje têm problemas de abastecimento. Foi muito importante esta audiência pública porque nos ajuda a dialogar com a sociedade, mostrando a importância da DESO como empresa pública e os riscos da privatização”, apontou Silvio Sá.
Novo marco legal
O assessor de Saneamento da FNU, Edson Aparecido, parabenizou o sindicato pelas lutas e destacou que o SINDISAN tem sido um exemplo para todos os sindicatos de urbanitários do Brasil, por conseguir combinar a luta em defesa dos direitos da categoria com a luta em defesa do saneamento básico como bem público e direito da população. Em sua exposição, Edson debateu o conteúdo e as consequências da Lei 14.026/2020, que alterou o marco legal do saneamento no país, com rebatimento direto nos estados e municípios, nas companhias públicas e serviços autônomos do setor, e com implicações também para a população.
Para ele, a Lei 14.026/2020 congrega várias falácias que servem somente para atingir as empresas públicas de saneamento e abrir espaços para a entrada maciça da iniciativa privada no setor, sem que isso signifique melhorias concretas para a população e investimentos na universalização dos serviços de água e esgotamento.
“O fato é que o setor privado não vai colocar dinheiro no saneamento. Ele vai buscar nas instituições públicas, no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço dos trabalhadores, no BNDES, etc. Mas a disputa da narrativa em favor do setor privado e contra o setor público é muito forte em todos os aspectos”, ressaltou, reforçando que, em se tratando de saneamento básico e os interesses da população, a privatização não é a solução.
“Nós entendemos que privatizar não é a saída, porque as grandes carências de saneamento, hoje, no Brasil, estão nas periferias das grandes cidades, nas favelas, nas áreas rurais e quilombolas, etc. E vocês acham que o setor privado, que hoje é controlado por grandes grupos internacionais de investimentos, vai estar preocupado em atender a essa população? Não! Porque eles estarão preocupados em atender os interesses desses fundos de investimentos. A privatização vai aprofundar a dificuldade de acesso dessas populações aos serviços de saneamento básico, não tenham dúvida”, explicou, reforçando a necessidade de, na contramão desse movimento, fortalecer o papel do Estado como agente de desenvolvimento do país e das empresas públicas de saneamento como a DESO.
Capacidade econômico-financeira
O engenheiro civil Rodrigo Fernando apresentou dados importantes sobre a DESO e as estratégias para universalização e melhoria dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário em Sergipe. Ele lembrou que, a partir das exigências do novo marco legal do saneamento e do Decreto Federal nº 10.710/21, que determinou que até 31 de dezembro de 2021, todas as companhias estaduais de saneamento deveriam comprovar às agências reguladoras a capacidade econômico-financeira para a universalização dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário até 2033, a DESO contratou consultorias técnicas externas para fazer os levantamentos necessários e responder às exigências legais.
“Fizemos o dever de casa. Após um enorme esforço e num espaço de tempo muito curto, a DESO conseguiu concluir esses levantamentos, apresentá-los em tempo hábil e teve a sua capacidade econômico-financeira aprovada pela Agrese e ANA. Ou seja, ficou demonstrado que a DESO tem total capacidade de universalizar o saneamento no estado de Sergipe até 2033, e isso foi avalizado por instituições sérias”, enfatizou, apontando o enorme trabalho de captação de recursos que a companhia já vem fazendo para cumprir as metas de universalização. Ainda segundo Rodrigo, a DESO tem dado lucro, e esses lucros já estão sendo reinvestidos na própria companhia em projetos de saneamento.
Auto-suficientes
Último a falar, o economista Luiz Moura fez um apanhado das empresas públicas de Sergipe e do papel que cumpre cada uma, elencando as que dependem de aportes financeiros do Estado e as que não dependem. Das 12 apontadas, apenas quatro são auto-suficientes: Sergas, Segrase, Banese e DESO, sendo que estas duas últimas dão grandes lucros para o Estado.
Segundo o economista, apesar de o resultado das últimas eleições apontar, em nível federal, com a eleição do presidente Lula, uma possível mudança positiva em relação ao fortalecimentos das empresas públicas, em nível estadual, o próximo governador pensa diferente e pode se sentir tentado a buscar meios de privatizar ativos de algumas dessas empresas para fazer caixa, com maior possibilidade para o Banese e para a companhia de saneamento, como aconteceu em Alagoas.
“É preciso levar em consideração que o governador eleito pela maioria dos sergipanos tem um visão no mínimo diferente do papel de uma empresa pública. Ele pode chegar numa situação de querer buscar recursos para tocar determinados investimentos e olhar para o Banese e a DESO. Só não se sabe a forma de privatização que ele pode escolher. Eu vejo tempos difíceis para os trabalhadores da DESO”, alertou o economista.
Contribuíram com o debate o vereador Ricardo Vasconcelos (Rede), representando a Câmara Municipal de Aracaju, e o presidente da CUT/SE, Roberto Silva. Marcaram presenças, também, na audiência pública, o vice-prefeito de São Cristóvão, Paulo Júnior (PV) e os vereadores Marcos Lázaro (PT) de São Cristóvão; Cássio Mateus (PP) de Japoatã; João Paulo Guedes (PDT) de Neópolis; e Linda Brasil (Psol) de Aracaju; além de diversas representações do movimento sindical e social. O deputado estadual Georgeo Passos (Cidadania) enviou representação.