A Sessão Especial teve como palestrante principal o engenheiro civil, sanitarista, especialista em Saneamento e professor emérito da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Luiz Roberto Santos Moraes, e contribuições do presidente do Sindisan, Silvio Ricardo de Sá, do presidente da Central Única dos Trabalhadores de Sergipe (CUT-SE), Roberto Silva dos Santos, e da secretária-geral da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e dirigente do Sindisan, Iara da Costa Nascimento.
Crise global e mudanças climáticas
Para ele, não é aceitável o negacionismo em relação à crise climática global, tendo em vista os estudos avançados e os dados concretos sobre as mudanças climáticas, além dos efeitos já amplamente percebidos em todo o mundo, como o derretimento das calotas polares; o aumento no nível dos oceanos com inundações em cidades costeiras; a alarmante diminuição do suprimento de água, a exemplo das graves secas em rios da Amazônia; tempestades mais fortes e severas, a exemplo do sul do Brasil; o avanço do ressecamento do solo e da desertificação; as fortes ondas de calor, com óbitos em vários países; e o aumento de doenças tropicais, como malária, febre amarela e dengue.
Moraes também abordou as várias legislações e resoluções, a exemplo da Resolução da ONU (RES/64/292, de 28/07/2010) que reconhece formalmente o direito à água de beber segura e limpa e ao saneamento como um direito humano que é essencial para a concretização dos demais direitos, para destacar que é preciso a sociedade cobrar dos governantes, em todas esferas, e dos setores empresariais e econômicos o efetivo cumprimento desses documentos e dos acordos internacionais firmados com vistas a enfrentar a atual crise global climática e seus efeitos, que atingem mais severamente os países mais pobres.
Também destacou que existem Propostas de Emenda à Constituição (PEC) importantes tramitando no Congresso Nacional e que precisam ser aprovadas, como as PEC 93/2015, PEC 2/2016 (aprovada pela CCJC em 2022, aguardando votação em Plenário) e PEC 425/2018, que propõem incluir o saneamento básico como direito social; além da PEC 6/2021, que inclui o acesso à água potável entre os direitos e garantias fundamentais (art. 5º da Constituição).
O palestrante lamentou, ainda, a aprovação da Lei Federal nº 14.026, de 15/07/2020, que atualizou o Marco Legal do Saneamento Básico para beneficiar o capital privado e permitir a privatização desenfreada do setor, como já aconteceu no Rio de Janeiro, Alagoas, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe, com impactos negativos já sentidos pela população, especialmente a parcela mais pobre, com significativos aumentos tarifários e quase nenhum avanço na universalização dos serviços.
“A universalização do saneamento básico apresenta grandes desafios de mudança cultural, que cabem a cada um de nós, como trabalhadores, técnicos, pesquisadores, políticos, legisladores e operadores da lei, dirigentes e gestores, mas, sobretudo, como cidadãos, enfrentá-los. Nesse sentido, torna-se necessário muita luta política e jurídica pela frente para garantir um dia o direito humano à água e ao esgotamento sanitário para todas e todos”, concluiu Moraes.
Escassez hídrica e privatização
Silvio lembrou dos vários usos da água e destacou que os setores que mais a consomem são exatamente o industrial e o agronegócio, quando a prioridade é o abastecimento humano. Ele destacou, ainda, a realidade de Sergipe, que não possui grandes bacias nem mananciais aquíferos, dependendo muito do Rio São Francisco e sendo suscetível à escassez hídrica.
Silvio também ressaltou o fato de o governo estadual ter privatizado, em setembro do ano passado, parte dos serviços da Companhia de Saneamento de Sergipe (DESO), que passou a atuar apenas com a captação e tratamento da água bruta – a parte do serviço mais onerosa –, repassando os demais serviços – a parte mais lucrativa – para a empresa privada Iguá Saneamento/Sergipe, que também assumiu 100% dos SAAEs de Estância, Carmópolis e São Cristóvão. Apenas o SAAE de Capela escapou.
“É preciso dizer que os investimentos que serão feitos para a universalização da água e do esgotamento sanitário serão feitos nas áreas urbanas, sendo que a população que mais sofre, nas periferias, nas regiões ribeirinhas, nos assentamentos, nos povoados, os indígenas, os quilombolas, para esses a empresa privada não vai levar água”, lamentou o sindicalista.
Impactos dos reajustes tarifários
“Quem tem dinheiro, paga qualquer preço que for cobrado, mas a classe trabalhadora, em sua maioria, não. Aqueles trabalhadores com subemprego, os que vivem de salário mínimo serão seriamente impactados”, disse.
Roberto Silva também levantou a questão da implementação da nova tarifa social, com a Lei 14.898/2024, e seu impacto na tarifa da Iguá Sergipe, bem como o risco de sustentabilidade com o que restou da DESO, que ficou com o serviço mais pesado e oneroso, e a Iguá ficando com a parte mais lucrativa, e como a estatal sergipana fará os investimentos necessários para garantir a oferta de água no futuro.
“Se a DESO vai ficar com a parte deficitária, quem fará esses investimentos? Será o Governo do Estado ou será com uma taxa extra, embutida na tarifa dos sergipanos? Isso não está claro no edital e o nível de insegurança para a população é absurdo. Nós poderemos chegar lá na frente com uma tarifa de água e esgoto impagável para a maioria dos sergipanos”, alertou Roberto Silva, que questionou, ainda, o fato de que restará pouco espaço para controle social do contrato e dos reajustes tarifários, já que será a Agrese que ficará responsável por isso, sendo que a agência não tem servidores efetivos, apenas comissionados.
BNDES e as privatizações
“O que estamos reivindicando é que o BNDES cumpra o seu papel social e invista nas empresas públicas, e não atue para financiar privatizações, concessões ou PPPs, favorecendo as empresas privadas. Água é um bem essencial e um direito de todos. Água não pode ser privatizada”, disse a dirigente.
O vereador Camilo Daniel (PT) esteve presente na atividade e a vereadora Sônia Meire (Psol) foi representada por sua assessoria. Também participaram da sessão o presidente do Psol de Aracaju, Ramon Andrade; a representante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Maria das Graças; diretores do Sindisan, trabalhadores da DESO; dirigentes da CUT-SE; dirigentes de sindicatos e de movimentos sociais, além de representantes da Ocupação Beatriz Nascimento.