Audiência Pública lotou plenário e galerias da Alese

Por iniciativa dos deputados estadual Iran Barbosa (PT) e federal João Daniel (PT), a Assembleia Legislativa de Sergipe debateu, nesta segunda-feira (25), em Audiência Pública, “A hibernação e os riscos de privatização da Fafen”. O tema foi discutido pelo dirigente nacional da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Gerson Luiz Castellano; pelo também dirigente da FUP e funcionário da Fafen-BA, Jailton Barbosa Andrade; e pelo dirigente do Sindipetro-SE/AL, Edvaldo Leandro. O ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, inicialmente convidado para ser o palestrante principal, por problemas com os voos para Aracaju, não pôde participar. Os senadores Rogério Carvalho (PT) e Alessandro Vieira (PPS) fizeram parte da mesa e também contribuíram com o debate.

A Audiência, construída em conjunto com a Federação Única dos Petroleiros (FUP), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o Sindicato dos Petroleiros de Sergipe e Alagoas (Sindipetro-SE/AL), contou com a participação de parlamentares federais, estaduais e municipais, prefeitos,  ex-parlamentares, representantes do órgãos de Estado, dos movimentos sindical, social e estudantil, de lideranças populares, trabalhadores da unidade da Fafen de Laranjeiras e da população em geral.

O deputado Iran Barbosa lembrou que não é a primeira vez que o governo federal, acionista majoritário da Petrobras, tenta fechar ou privatizar a Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados – Fafen de Sergipe e da Bahia, mas a resistência dos trabalhadores e de setores organizados da sociedade impediram que se efetivasse. Para Iran, defender a Fafen é defender a economia sergipana e também a soberania alimentar do povo brasileiro.

“Nós, mais uma vez, resistiremos. A Fafen é estratégica e cumpre um papel fundamental num país como o Brasil, que tem grande vocação para a produção de alimentos e é um grande exportador desse setor; e uma fábrica de fertilizantes estatal tem uma importância muito grande em um país com esse perfil. Além disso, precisamos lembrar da importância da Fafen para a agricultura familiar e para os pequenos agricultores, que são os responsáveis pela maior parte da produção agrícola que chega em nossas mesas. A Fafen é fundamental para a nossa produção de alimentos e para a nossa economia. Portanto, estamos falando de soberania alimentar do nosso país, o que não é pouca coisa”, destacou.

Para o petista, qualquer pessoa que minimamente analise o que era economia sergipana antes e depois da Fafen vai identificar que o cenário era um antes e outro completamente diferente depois, graças ao desenvolvimento gerado pela fábrica e pelos investimentos feitos no seu entorno.

“A Fafen cumpriu uma tarefa de ampliação do desenvolvimento do nosso Estado, e continua cumprindo. Portanto, é fundamental mantermos essa fábrica estatal, aberta e funcionando adequadamente porque há toda uma cadeia produtiva no seu entorno que gera emprego e renda para muita gente. Com o fechamento ou privatização da Fafen, Sergipe ficará menor. Esperamos, a partir dessa Audiência, ampliar esse debate e envolver os mais diversos setores da nossa sociedade e da classe política sergipana. Não podemos é ficar silenciosos. O atual momento exige de todos nós posição e providências no sentido de defender essa importante fábrica para Sergipe e para o Brasil”, enfatizou Iran Barbosa.

Mobilização e pressão

O deputado federal João Daniel destacou que a Fafen de Sergipe é crucial para a economia e para a geração de empregos. Para ele, são fundamentais iniciativas como uma audiência pública em defesa não só da Fafen, mas de um projeto de soberania para o Brasil e para o estado de Sergipe. Para isso, entende o parlamentar, é preciso haver pressão política e social para impedir o avanço do projeto de desmonte do Estado implementado pelo governo Bolsonaro.

“É possível, como muita mobilização, impedirmos a hibernação ou a privatização da Fafen, como se impediu em outros momentos, pela força do movimento sindical com apoio da sociedade. Não podemos ficar calados nem cruzar os braços. É preciso usar todas as forças e meios para impedirmos esse projeto de desmonte da nossa soberania em curso no Brasil, destruindo empresas estatais que foram construídas como muito trabalho, suor e sacrifício do povo brasileiro. Não podemos aceitar que um país que é um dos maiores exportadores agrícolas do mundo, mas é importador de fertilizantes, renuncie à produção de fertilizantes para ficar completamente dependente das grande empresas produtoras multinacionais”, colocou.

Risco de desabastecimento

Em sua fala, Gerson Castellano lembrou que o agronegócio no Brasil é responsável por 23,5% do Produto Interno Bruto, mas, em contrapartida, o país depende da importação de 76% de fertilizantes nitrogenados. Caso as fábricas da Petrobras sejam fechadas ou vendidas, passará a depender 100% do mercado internacional. E isso dentro de uma realidade em que, apesar da imensa fronteira agrícola que desponta, os solos brasileiros, em grande parte, são pobres de nutrientes.

“A União, abrir mão de produzir fertilizantes por questões meramente financeiras, é irresponsável. O Estado não pode se guiar apenas pelo lucro, assim como não podemos ficar reféns das variações da geopolítica internacional. Qualquer conflito ou barreira imposta pelos países exportadores de fertilizantes, teremos quebra de safras e desabastecimento. Portanto, o que está em jogo com a Fafen é a nossa soberania alimentar. Essa política de desinvestimento nas nossas fábricas de fertilizantes é equivocada e é também um crime contra o povo brasileiro”, salientou.

Gerson enfatizou que é uma falácia o discurso de que se privatizar a Fafen, ela passará a ser rentável e a dar lucro. O sindicalista, que é do Paraná, lembrou que a Fafen de Araucária-PR foi a única que acabou privatizada no início dos anos 90 e, depois disso, passou 20 anos nas mãos da iniciativa privada sem que houvesse investimentos em sua planta. Resultado: acabou completamente sucateada e, em 2013, no governo Dilma-PT, foi reestatizada, retornando ao Sistema Petrobras; com investimentos, voltou a operar com retorno para o Estado e para a população. E agora, está sob nova ameaça de privatização.

Para ele, é preciso que a Petrobras cumpra o seu papel de empresa estatal que pensa muito além do lucro, mas no bem-estar do povo brasileiro e na soberania do país. “Caso se prossiga com essa política de desmonte, não será Sergipe ou a Bahia que sofrerá as consequências, mas todo o Brasil. A sociedade e a história haverão de cobrar daqueles que se omitirem dessa luta na defesa das nossas fábricas de fertilizantes e da nossa soberania”, afirmou.

Carne com formol

Jailton Andrade lembrou que a Fafen da Bahia só não hibernou ainda por conta de decisão liminar, mas que, segundo informações já levantadas, a gerência de produção da unidade só está aguardando a liminar ser derrubada para executar o plano de hibernação, sem maiores discussões.

Ele destacou a importância da produção da ureia pecuária da Fafen para o Brasil, que é o maior exportador de carne bovina do mundo, lembrando que, diferente da ureia agrícola, a importação da ureia pecuária – que não pode receber nenhum tipo de aditivo – é muita cara. Como consequência, Jailton alertou para o risco de que, em substituição, os produtores brasileiros passem a utilizar insumos com formol, que é altamente cancerígeno.

“Se as nossas fábricas pararem de produzir a ureia pecuária pura, o risco que a população brasileira corre é de, em pouco tempo, passar a consumir carne de gado contendo formol, que é cancerígeno. Isso já aconteceu com o leite e pode voltar a acontecer com a nossa carne”, alertou.

O sindicalista lembrou que decisão recente do Supremo Tribunal Federal, através do ministro Ricardo Lewandowski, impõe que a Petrobras, por seu caráter público, não pode arrendar ou vender nenhuma de suas unidades sem o aval do Congresso Nacional.

“Temos que fazer valer essa decisão para barrar essa irracionalidade da Petrobras apenas para satisfazer os desejos e interesses do grande capital. E o pior, sem nenhum argumento plausível. Eles querem vender mesmo que a gente prove que as nossas empresas podem ser rentáveis. A Petrobras é quem fornece o gás para a Fafen. É só baixar o preço. Mas eles não o fazem. Por que? É política deliberada de tornar as fábricas inviáveis para entregar a preço de banana ao capital privado”, criticou.

Desenvolvimento tecnológico

Edvaldo Leandro, do Sindipetro-SE/AL, também chamou a atenção para a política de sabotagem da Petrobras em relação ao preço do gás que fornece à Fafen, totalmente lesivo aos interesses da fábrica. Destacou também que abrir mão da Fafen é a abrir mão de desenvolvimento tecnológico na produção de fertilizantes que poucos países dominam.

“Quem tem muito gás como nós temos, não pode abrir mão dessa tecnologia. O mesmo crime que vêm cometendo contra a Petrobras em relação ao petróleo, estão cometendo contra a Fafen e contra o povo brasileiro”, ressaltou.

O dirigente enfatizou que entregar a Fafen ao capital privado, além de atentar contra a soberania do país, suprimir empregos e renda local, e prejudicar a produção de alimentos, também coloca em risco a vida da população, em especial as que vivem no entorno das fábricas.

“Todos nós sabemos que entre o lucro e a vida, o capital e os acionistas estão mais preocupados é com o lucro. Portanto, os riscos de termos problemas ambientais são reais. A Vale é um grande exemplo da pior consequência das privatizações: acabou com empregos, com o meio ambiente e com vidas”, disse Edvaldo Leandro. “Não podemos deixar que isso aconteça aqui com a Fafen por causa da irresponsabilidade do governo federal. Essa luta tem que ser de todos e tem que continuar”, completou.

Após a fala do sindicalista, o deputado Iran Barbosa pediu um minuto de silêncio em memória das vítimas do rompimento da Barragem número 1 da Vale, em Brumadinho (MG), que aconteceu há exato um mês e deixou 179 mortos e vários desaparecidos.